quarta-feira, 29 de julho de 2009

Carta do Dr. Sapucaia a Ricardo Mota


Sapucaia: "Deputado poderá eliminar a minha vida, como costuma fazer"

Do desembargador Antônio Sapucaia, o blog recebeu o texto abaixo, que além do humor que caracteriza o também jornalista, traz uma contundente declaração sobre o deputado Cícero Ferro.

Certo deputado estadual foi à tribuna da Assembléia Legislativa e a um dos programas da Rádio Gazeta e, de forma injuriosa e atrevida, acusou-me de haver desviado R$ 1.740.000,00 do Tribunal de Justiça de Alagoas.

Não conheço pessoalmente o iminente parlamentar (escrevo com "i", pois ele vive sempre na iminência de praticar algum mal); nunca lhe fiz crítica alguma; nunca julguei nada, na condição de magistrado, contra ou a favor dele, ignorando, portanto, a sua existência, salvo as vezes que o vejo na televisão algemado e conduzido à cadeia.

Por uma questão de assepsia moral, não vou citar-lhe o nome. Devo dizer simplesmente que, mesmo que eu tivesse a vocação do parlamentar, eu jamais poderia ter desviado um centavo que fosse do TJ de Alagoas, porquanto nunca exerci qualquer função administrativa naquela Assembléia Judiciária. Tudo que recebi ao longo de 43 anos de serviço público, dos quais 37 anos foram dedicados à magistratura, me foi devido. Desafio a quem quer que seja a provar o contrário, inclusive o próprio Tribunal de Justiça e o Conselho Nacional de Justiça. Jamais me aconchegou à conta bancária alguma importância a que eu não fizesse jus, especialmente a fortuna mencionada irresponsável e levianamente pelo parlamentar.

Se o deputado não gosta de mim por haver afastado das atividades parlamentares nove colegas seus, não havia, como não há, a mais mínima razão para injuriar-me de forma tão desbragada e libertina. Importante é pontuar que, ao afastá-los temporariamente do Legislativo estadual, fi-lo - conforme se vê no meu despacho -, com fito de que evitassem exercer qualquer influência na colheita de provas na ação em andamento, atendendo a uma postulação do Ministério Público. Apenas cumpri o meu dever, e qualquer magistrado de bom senso teria feito a mesma coisa. Diga-se que em momento algum eu os chamei de ladrões ou bandidos, uma vez que as provas carreadas para os autos dependiam de apuração a ser feita na instrução do processo, que deveria ficar a cargo do juiz competente. Se houve demora na colheita probatória, não me coube nenhuma culpa, como se depreende das afirmações feitas pelo Dr. Gustavo Souza Lima, que justificou as razões da demora no andamento das ações ajuizadas em desfavor dos parlamentares afastados.

Portanto, eu não merecia as pedradas verbais que me foram atiradas pelo neurótico parlamentar. É possível que no fundo seja ele uma pessoa de bons predicados, mas seu comportamento e as suas manifestações na tribuna da Casa de Tavares Bastos e através da imprensa mostram, às completas, verdadeiros desvios de conduta, que podem ser corrigidos por meio de tratamento psiquiátrico ou, talvez, psicológico. O parlamentar é médico e poderá recorrer aos colegas do ramo especifico, visando curá-lo de seus destemperos e das suas diatribes, evitando, assim, que Hipócrates e Tavares Bastos possam se contorcer nos respectivos túmulos, arrependidos de terem desperdiçado os seus ensinamentos.

Não pretendo polemizar com o deputado; apenas me limitarei a ajuizar uma ação por danos morais, objetivando uma indenização que se destinará à Fazenda Esperança, em Marechal Deodoro, que dedica suas atividades à recuperação de drogados. Não é sem razão que sempre achei que qualquer tormenta ou dor moral não pode ser ressarcida com dinheiro, mas, sim, deve ter função meramente pedagógica, sobretudo se o dinheiro é de origem duvidosa. Insanidade, mendacidade e cleptomania são patologias que, salvo engano, podem ser curadas, bastando ter coragem e disposição para fazê-lo.

Dispondo dos poderes e da impunidade que o cercam, por força do mandato parlamentar, o deputado poderá mandar eliminar a minha vida, como costuma fazer, utilizando armas e capangas pagos com dinheiro público. Entretanto, em nenhuma circunstância ele jamais poderá eliminar a minha dignidade, mesmo usando da sua baba peçonhenta.

Quanto aos 15 minutos de fama que me foram atribuídos pelo parlamentar, posso afirmar que foram decorrentes do cumprimento do dever. E se cumprir o dever resulta em fama, asseguro de consciência tranqüila que eu a desfrutei durante 37 anos, em vez de apenas 15 minutos.

Por derradeiro, lanço um desafio público ao deputado. Convido-o a provar, em documento que devamos sacramentar em cartório, se em qualquer tempo da minha vida pública eu usei de algum centavo que não me fosse devido, constando o seguinte compromisso: se ele provar o contrário, eu renunciarei aos proventos que recebo como desembargador aposentado; se ele não o fizer, após as devidas formalidades, o deputado renunciaria ao mandato e à atividade política, para o bem e a felicidade do povo alagoano.

Antônio Sapucaia
(*) Desembargador aposentado, atual Diretor-Presidente do Detran-AL.

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